A senadora Marinor Brito (PSOL/ PA) entrou hoje com representação, na Procuradoria do Senado Federal, contra o deputado Jair Bolsonaro.
Durante uma entrevista em que a senadora Marta Suplicy explicava os motivos da retirada do PL nº 122 da pauta do dia da Comissão de Direitos Humanos, Bolsonaro criava tumulto exibindo uma cartilha de conteúdo homofóbico para as câmeras. A senadora Marinor reagiu às agressões e à tentativa de intimidação durante a entrevista, e exigiu que ele se retirasse com os panfletos, que pregam a violência contra homossexuais.
Na discussão, Bolsonaro demonstrou uma atitude recorrente de misoginia. Marinor afirma que a atitude do deputado é desrespeitosa e que se sentiu ofendida em sua feminilidade.
Na semana que vem, o PSOL entrará com representação na Corregedoria da Câmara dos Deputados. Além disso, a senadora entrará com uma ação penal na justiça, pelos crimes de injúria e danos morais.
Confira a representação:
Excelentíssimo Senhor SENADOR DEMÓSTENES TORRES
PROCURADOR PARLAMENTAR DO SENADO FEDERAL
Marinor Brito, Senadora da República pelo PSOL/PA, com domicílio na Ala Tancredo Neves gab. 49, Senado Federal, Brasília-DF, vem diante de Vossa Excelência, com fulcro no art. 55, § 1º, da Constituição Federal, combinado com o disposto nos arts. 5º, incisos III e 12 do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, apresentar a presente
DENÚNCIA DE PRÁTICA DE ATO ATENTATÓRIO AO DECORO PARLAMENTAR
do Senhor Deputado jair messias bolsonaro, brasileiro, militar, Deputado Federal pelo Partido Progressista (PP-RJ), pelas razões de fato e de direito adiante expostas:
Dos Fatos
No dia 12 maio de 2011, terminada Reunião da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, na qual fora pautado o Projeto de Lei da Câmara nº122/06, que criminaliza a homofobia, o Deputado Federal Jair Bolsonaro protagonizou mais uma cena de homofobia na Ala Nilo Coelho do Senado Federal. Diante da má conduta do Representado, a ora Representante interpelou-o de forma veemente para que pusesse fim à desrespeitosa manifestação. Após a saída da Representante do local, o Deputado Federal assacou, conforme comprova matéria jornalística anexa, a seguinte afirmação:
“Ela agrediu! Ela bateu em mim. E eu sou homofóbico? Ela é heterofóbica. Não pode ver um heterossexual na frente dela que alopra! Já que está difícil ter macho por ai, eu estou me apresentando como macho e ela aloprou. Não pode ver um heterossexual na frente. Ela deu azar duas vezes: uma que sou casado e outra que ela não me interessa. É muito ruim, não me interessa.”
Verifica-se na afirmação do Deputado ora representado a ofensa moral dirigida à Representante, revelando a prática de ato atentatório ao Decoro Parlamentar, conforme será a seguir demonstrado.
Da imunidade parlamentar
O Deputado Federal Jair Bolsonaro tem imunidade parlamentar, na forma do art. 53 da Constituição Federal, abaixo transcrito:
“Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.”
Entretanto, a imunidade parlamentar não é absoluta. O Supremo Tribunal Federal, que é, constitucionalmente, o responsável pela guarda da Constituição, na forma do art. 102 da Constituição Federal, tem o entendimento pacífico a respeito dessa matéria, senão vejamos:
"A imunidade material prevista no art. 53, caput, da Constituição não é absoluta, pois somente se verifica nos casos em que a conduta possa ter alguma relação com o exercício do mandato parlamentar. " (Inq 2.134, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 23-3-2006, Plenário, DJ de 2-2-2007.)
Da decisão acima, verifica-se que a imunidade parlamentar apenas se verifica nos casos em que a conduta possa ter alguma relação com o exercício do mandato. No caso em tela, a afirmação feita pelo Deputado Jair Bolsonaro foi de ordem pessoal atingindo moralmente a Representante. A afirmação de que a Representante “Não pode ver um heterossexual na frente dela que alopra! Já que está difícil ter macho por ai, eu estou me apresentando como macho e ela aloprou. Não pode ver um heterossexual na frente. Ela deu azar duas vezes: uma que sou casado e outra que ela não me interessa. É muito ruim, não me interessa ” não pode se encaixar no âmbito da imunidade parlamentar.
A jurisprudência do STF sobre essa matéria é vasta, cabendo trazer à baila algumas decisões que balizam a intepretação sobre a relatividade da imunidade parlamentar:
"Queixa-crime ajuizada por ex-Senador da República contra Deputado Federal, por infração aos arts. 20, 21 e 22 da Lei de Imprensa. Delitos que teriam sido praticados por meio de declarações feitas em programa de televisão apresentado pelo querelado. Alegação de imunidade parlamentar (art. 53 da Constituição da República): improcedência. As afirmações tidas como ofensivas pelo querelante não foram feitas em razão do exercício do mandato parlamentar: hipótese em que o querelado não está imune à persecução penal (imunidade material do art. 53 da Constituição da República)." (Inq 2.390, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 15-10-2007, Plenário,DJ de 30-11-2007.) (Grifos nossos)
"A garantia constitucional da imunidade parlamentar em sentido material (CF, art. 53,caput) – destinada a viabilizar a prática independente, pelo membro do Congresso Nacional, do mandato legislativo de que é titular – não se estende ao congressista, quando, na condição de candidato a qualquer cargo eletivo, vem a ofender, moralmente, a honra de terceira pessoa, inclusive a de outros candidatos, em pronunciamento motivado por finalidade exclusivamente eleitoral, que não guarda qualquer conexão com o exercício das funções congressuais." (Inq 1.400-QO, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 4-12-2002, Plenário, DJ de 10-10-2003.) No mesmo sentido: Pet 4.444, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 21-10-2008, DJE de 28-10-2008.
"A garantia constitucional da imunidade parlamentar em sentido material (CF, art. 53,caput) – que representa um instrumento vital destinado a viabilizar o exercício independente do mandato representativo – somente protege o membro do Congresso Nacional, qualquer que seja o âmbito espacial (locus) em que este exerça a liberdade de opinião (ainda que fora do recinto da própria Casa legislativa), nas hipóteses específicas em que as suas manifestações guardem conexão com o desempenho da função legislativa (prática in officio) ou tenham sido proferidas em razão dela (práticapropter officium), eis que a superveniente promulgação da EC 35/2001 não ampliou, em sede penal, a abrangência tutelar da cláusula da inviolabilidade. A prerrogativa indisponível da imunidade material – que constitui garantia inerente ao desempenho da função parlamentar (não traduzindo, por isso mesmo, qualquer privilégio de ordem pessoal) – não se estende a palavras, nem a manifestações do congressista, que se revelem estranhas ao exercício, por ele, do mandato legislativo. A cláusula constitucional da inviolabilidade (CF, art. 53, caput), para legitimamente proteger o parlamentar, supõe a existência do necessário nexo de implicação recíproca entre as declarações moralmente ofensivas, de um lado, e a prática inerente ao ofício congressional, de outro. Doutrina. Precedentes." (Inq 1.024-QO, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 21-11-2002, Plenário, DJ de 4-3-2005.)
Da quebra de decoro parlamentar
O Regimento Interno da Câmara dos Deputados determina no art. 244 que:
“244. O Deputado que praticar ato contrário ao decoro parlamentar ou que afete a dignidade do mandato estará sujeito às penalidades e ao processo disciplinar previstos no Código de Ética e Decoro Parlamentar, que definirá também as condutas puníveis.”
Seguindo na fixação da conduta do Representado como ofensiva ao decoro parlamentar, ressalta o art. 5º, inciso III, do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, segundo o qual:
“Art. 4° Atentam, ainda, contra o decoro parlamentar as seguintes condutas, puníveis da forma deste Código:
III — praticar ofensas físicas ou morais nas dependências da Câmara ou desacatar, por atos ou palavras, outro parlamentar, a Mesa ou Comissão, ou os respectivos Presidentes;”
Da afirmação feita pelo Deputado Jair Bolsonaro, infere-se a subsunção da ação do Representado na hipótese de incidência supra consignada, vale dizer, praticou o Representato, ato atentatório ao decoro parlamentar, merecendo ser instaurado processo disciplinar com vista sa coibir tais condutas por Deputados Federais.
Não se pode ter a conduta do Representado como digna de um parlamentar. A afirmação do Representado, carregada de misoginia não pode ser admitida por essa Casa de Leis. O Parlamentar deve servir de exemplo à sociedade. E qual o exemplo dado pelo Representado? A intolerância pelos homossexuais, a misoginia e o preconceito. É passada a hora de uma censura à forma pela qual o Deputado exterioriza a sua ideologia e é esse o motivo primaz da presente representação.
De ressaltar-se que a conduta do Representado revela, ainda, abuso da prerrogativa de imunidade (art. 53, CF), vez que a inviolabilidade do parlamentar se refere a suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato, devendo responder ele por atitudes que não se inserem no âmbito da atividade parlamentar.
Dos Pedidos
Diante de todo o exposto, requer-se:
I – o recebimento da presente Denúnica e o encaminhamento de Representação à Corregedoria da Câmara dos Deputados para a instauração do Processo Disciplinar, ante a prática de ato atentatório ao decoro parlamentar pelo Deputado Federal Jair Bolsonaro; e
Requer-se, por fim, a produção de provas por todos os meios admitidos, inclusive a reuisição do vídeo divulgado pela TV GLOBO e o depoimento pessoal do Representado.
Termos em que,
Aguarda deferimento,
Brasília, 12 de maio de 2011.
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